sábado, 12 de abril de 2008

Errante?




"Às vezes acordo de madrugada e me sinto completamente perdido. Flutuo no espaço como se não pertencesse ao meu corpo. Nesses momentos, eu me perguno apavorado: será que este lugar é perigoso? Onde estou exatamente?
Sob o império do medo, luto para retornar a consciência. À medida que começo a perceber alguns ruídos e a olhar a meu redor, recupero a memória. Pouco a pouco, lembro-me do lugar onde estou e as razões pelas quais ali me encontro. Esse sentimento de desorientação pode ocorre-me em qualquer lugar: na couchette de um trem noturno, em alguma parte da Índia ou deitado numa cama de campanha nos arredores de um vilarejo africano, dormindo a céu aberto sem ter sequer a proteção de uma tenda. Enquanto vou acordando, lentamente, meu olfato, por sua vez, se compõe. Cada lugar possui um aroma particular. A Índia tem o seu, bem como os desertos da Arábia ou Paris.
Uma vez reconfortado pelos sons, visões e aromas, faço esforços para me localizar em alguma parte do globo terrestre. Ora, o mapa que tenho em mente não é mais o de minha juventude, em Tóquio, cujo centro do mundo era o Japão. Naquele mapa, a América estava localizada à extrema direia, depois do Oceano Pácífico, com Nova Iorque no outro extremo, à direita. À esquerda do Japão, havia China e a Índia, depois a Europa, e enfim Londres, bem na ponta. Hoje não é mais este mapa que evoco no meu despertar, mas aquele do Ocidente cujo centro é a Europa e onde o Japão é apens visível no lado de cima, á direita. Essa coleção de ilhotas do outro lado do mundo, para mim, transformou-se realmente no Extremo Oriente.
Hoje sei posicionar-me em qualquer ponto do globo sem a necessidade de ter o Japão como referência. Mas a sensação de flutuar no espaço como uma medusa à deriva persiste, fazendo nascer uma nova fonte de angústia . Para além desta cama onde estou deitado, tudo me parece estranho. Por que estou só? E por que neste lugar? Por que, na minha idade, ainda não tenho casa, nem família? Que ser é este no qual me transformei, jogado pra lá e pra cá, como uma alga flutuante?"
"OIDA, Yoshi . Um Ator errante"

Um comentário:

Anônimo disse...

sendo feita de gente, como insisto em querer achar, toda cidade tem algo em comum, mas ao mesmo tempo, e pelo mesmo motivo, cada uma tem sua peculiaridade.

Como pode alguém se achar desorientado, onde quer que esteja?
Ora, sua referência não existe mais.
E não é tudo uma questão de ponto de vista?
Se não há "ponto", como querer ter a "vista"?

Núcleo Transdisciplinar do Grupo de Dança da FAP